Cruzeiro do Sul apresenta sua sinopse para o Carnaval Virtual 2016

Introdução

O negro sofreu na América. Isso todo mundo já sabe. A diáspora africana em direção ao Novo Mundo foi causa de um sofrimento ímpar, que dura até hoje, escondendo-se nos costumes de uma sociedade atrasada.

Mas, não… Esse não é mais um conto de quando os negros sofriam nas lavouras, sujeitos aos castigos dos senhores, lavorando ao som do estalo do chicote e do clique das baionetas dos capitães-do-mato, entoando cânticos de louvação a seus orixás.

Nossa história vai começar de outro lugar.

Setor 1: Tristeza e Libertação – Blues e Jazz

Estados Unidos, década de 1920. A mistura da cultura negra africana com o Protestantismo inspirara a comunidade escrava das colônias do sul a entoar cânticos de tristeza e de saudade das suas terras. Trabalhavam nas lavouras cantando a plenos pulmões, pondo toda a força de sua raça nas notas altas das suas canções de desenraizamento. O homem branco sequer sabia que tipo de canto era aquele… Pensava que o escravo era feliz.

A inabalável fé em Deus explodia na Igreja Negra, onde o jazz era a trilha sonora.

Mas a Guerra de Secessão é recém-encerrada. O negro liberto pelas colônias industrialistas do norte se vê agora sem obrigações. Mas também sem terra, sem trabalho e sem ter o que comer. E agora?

Os negros que não se encontraram como arrendatários de microfúndios naquele mesmo sul se viram forçados a migrar para o norte para trabalhar nas industrias das colônias capitalistas, antiescravocratas. E a miséria os acompanhou. Mas também os acompanhou a mesma inabalável fé em Deus, exprimida em cantos tristes da gente que espera o dia do retorno do Altíssimo como a promessa de dias melhores no Paraíso.

No Norte, a realidade não era tão promissora quanto o prometido. O trabalhador, tão desempregado então como quando saíra do último lar, se entrega aos prazeres proibidos da cidade – bebidas, drogas, prostituição. A tristeza virara música novamente, e no conforto de uma velha gaita, ou tocando um violino em troca de moedas, o negro cria o blues – a canção da tristeza.

Com o passar do tempo, o blues ganha força e sofisticação, e os músicos independentes das ruas unem seus talentos. O jazz, mutável, ganha novas roupagens, como o ragtime e o dixieland, tradicional da histórica e quase mítica Nova Orleans.

Setor 2: Poder Para o Povo Preto – Funk e Soul

Obviamente o negro se cansaria de ser marginalizado. Os movimentos liberais e antirraciais revelaram expoentes políticos negros, como Malcolm X, Martin Luther King, Jr. e o Partido dos Panteras Negras. A música negra americana já tinha força o suficiente para tirar os pés da massa do chão com o rhythm-and-blues, mas a transgressão negra e os ideais da igualdade racial fariam surgir algo muito maior, de popularidade e impacto sem precedentes.

O jazz moderno e o R&B são abraçados pela Motown, dedicada à promoção de artistas negros. O soul, música religiosa negra que pedia emprestado do R&B o poder do convite e a força de suas notas, ganha força e espaço nas rádios. Embalado pelo som de sua guitarra, o revolucionário James Brown inova mais uma vez e cria o funk. A pele escura invade as artes, e personagens como Shaft e Cleopatra Jones erguem a bandeira da blaxploitation. A cultura negra mostra que é linda e diz a que veio. Poder para o povo preto!

Na década de 70, o negro podia ainda ser marginalizado, mas a sua música e a sua arte eram unanimidade. Ainda na onda do sucesso do R&B, a música psicodélica, a disco, ganha as ruas e até quem não é preto se convida para os Embalos de Sábado à Noite.

Setor 3: Anos Rebeldes – Hip-Hop, Rap e Pop

A cultura da rima do negro uniu-se com o ridículo do dia-a-dia nos subúrbios das grandes cidades. Os herdeiros de Luther King podem até não ter visto seus irmãos de cor lutando pela igualdade racial, mas conhecem a realidade dos presidiários e dos mendigos da cidade. Nasce então o hip-hop como música de protesto.

Enquanto isso, nos anos 80, um rei emerge. O gênio da música pop Michael Jackson lança aquele que seria o maior e mais vendido álbum da música pop da história – Thriller. A revolução criada por Michael elevaria muitos outros astros que adotaram seu estilo ao estrelato.

O negro que foge da cadeia zomba da polícia com o rap, a palavra-de-ordem falada, com bordões como “F…-se a Polícia”. A ousadia invade até a música considerada “branca”, com grupos negros adotando para si ritmos europeus, como o heavy metal e o seu “Culto à Personalidade”.

Setor 4: Black Music Exportação – Neo Soul, Axé e Samba

O sucesso do pop de Michael Jackson, do hip-hop de Snoop Dogg e do rap de Tupac lança a música negra para o resto do mundo. O fim dos anos 90 vê o retorno do soul, nas formas do neo-soul e do hip-hop soul, com força total, com músicos como Mariah Carey, Alicia Keys, Destiny?s Child e Lauryn Hill.

A internacionalização da música americana atinge o Brasil, e a fusão da cultura estrangeira com toda a história que nós já conhecemos cria o funk carioca – a palavra falada com um ritmo forte.

O que tudo isso tem a ver com o samba? Olhe para trás e veja a história da música do Brasil. Como ela acompanhou o povo em todas as eras e todas regiões, desde os centros populacionais até os mais remotos. Como a capoeira é o nosso blues; o carimbó, o ponto e o dai-me são o nosso soul; o axé é o nosso funk. E como toda essa história converge sempre em uma grande festa, um grande show. Um carnaval que não tem lugar nem hora pra acontecer.

É, nem sempre a história é a mesma, mas ela sempre termina no mesmo lugar.

É som de preto, de favelado…
Mas quando toca, ninguém fica parado!
Tá ligado?

(Amilcka e Chocolate – “Som de Preto”)

Author: Carnaval Virtual

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