Fazendo a sua estreia no grupo, o GRESV O Amor da Minha Vida apresentou o enredo que levará para a disputa do Grupo Especial, na edição comemorativa dos 10 anos do Carnaval Virtual.
De autoria de Rômulo Vieira e Gilce Vieira, a agremiação irá defender, em 2025, o enredo “A Morte”.
Confira abaixa sinopse oficial:
A MORTE
Há um momento em que tudo silencia.
Quando a pele arrepia, o peito encolhe e o tempo para.
É quando ela se aproxima. Não pede licença. Não veste fantasia.
Apenas paira — e faz a alma perguntar: o que é morrer?
Num mundo que esconde a morte atrás de cortinas e contratos,
o cortejo começa onde a palavra falta.
Nasce no medo ancestral, na sombra sem nome.
A morte como ausência que assombra.
Como abismo que não se olha.
Mas se o fim assusta, é porque viver queima.
O tempo se torna incêndio, e a vida, centelha.
Cada passo pode ser o último. Cada abraço, o derradeiro.
E, por isso, vale ouro. Vale samba. Vale choro e riso ao mesmo tempo.
Pelos cantos do mundo, a morte dança em muitas cores.
Sorri em caveiras floridas, se deita sobre tapetes brancos,
desce aos terreiros, sobe aos céus.
Tem nome, tem rito, tem canto — mas nunca o mesmo.
Em cada povo, uma maneira de partir.
Em cada fé, uma rota pra além.
E se a vida é pensamento,
a morte também é ideia que ronda filósofos e loucos.
Nos livros, ela é espelho. No verso, é dúvida.
O fim vira caminho de quem ousa pensar o existir.
Depois, ela sobe ao palco.
É musa de Cartola, atriz em tragédia, figura no cinema.
Canta, dança, morre e renasce em cena.
A arte, afinal, é um jeito bonito de eternizar o adeus.
Mas nem todo fim é justo.
Há quem nasça pra morrer cedo.
Quem nunca teve chance de viver direito.
Quem é apagado antes de ser lembrado.
Na calada, a morte escancara as vergonhas do mundo.
Mas onde tentaram silenciar,
a memória floresceu — e virou luta.
Fica, então, o luto.
A ausência desenha sua presença nas pequenas coisas.
A cadeira vazia. A foto empoeirada. A palavra não dita.
Mas também no que pulsa: a lembrança, o amor, o samba.
E quando a avenida parece se calar…
a bateria sobe, e o som do tambor faz pulsar novamente.
Porque a morte é parte do ciclo.
Folha que cai, semente que brota.
Silêncio que prepara a próxima canção.
No fim, ninguém parte.
Tudo recomeça.
Atravessar o tema da morte é tocar em uma das maiores perguntas da humanidade. O GRESV O Amor da Minha Vida propõe para o carnaval virtual 2025 uma narrativa em que a morte deixa de ser apenas fim e passa a ser reflexão, denúncia, celebração e renascimento.
O desfile começa envolto no mistério que habita o primeiro suspiro de medo: o desconhecido, o silêncio, a ausência que assombra – a morte como medo ancestral. Mas logo, a consciência do fim acende a centelha da vida. O tempo se torna urgência, e a finitude transforma-se em impulso: viver é preciso.
No caminho, a avenida se abre para os muitos rostos da morte ao redor do mundo. Ela é ritual, dança, canto e crença. Em cada cultura, um modo de partir. Em cada fé, um destino. O enredo percorre essas manifestações como um mapa espiritual e simbólico.
Ao lado das crenças, entram as ideias: a filosofia também tentou compreender o fim. Para alguns, a morte é libertação. Para outros, absurdo. No salão do pensamento, a morte é espelho que devolve perguntas.
Mas ela também pisa no palco. É arte, personagem, canção. Musa de poetas, atriz de tragédias, figura que dança entre notas e cenas. A morte na cultura popular é eternizada no samba, no cinema, no teatro.
E quando a fantasia começa a pesar, surge a verdade crua: a morte não é igual para todos. Algumas são silenciosas porque foram apagadas antes mesmo de viver. Pobres, negros, marginalizados: os que morrem sem direito ao luto. A avenida vira denúncia e resistência.
O luto então ocupa a avenida com sua delicadeza: a ausência, o vazio, os pequenos sinais de quem partiu. Mas do silêncio da saudade, brota a memória viva. E é ela que nos conduz ao fim do desfile.
O último setor é a apoteose do eterno retorno. A morte se despe da dor e veste-se de primavera. Cada adeus vira semente, cada lágrima vira rio que fertiliza o chão do futuro. E na explosão da vida que recomeça, é o samba que nos garante: ninguém parte de verdade. Quem canta, permanece. Quem ama, floresce. E quem samba… se eterniza.
Rômulo Vieira e Gilce Vieira
JUSTIFICATIVA DO ENREDO
A estreia do GRESV O Amor da Minha Vida no Grupo Especial é mais do que um momento de celebração. É um ato de coragem poética, de afirmação estética e de entrega total à arte do desfile. Para isso, escolhemos um tema que, ao mesmo tempo, nos assombra e nos humaniza: a morte.
Tratar da morte no Carnaval é um gesto que mistura sensibilidade e ousadia. Não buscamos o susto, tampouco o sofrimento. O que propomos é um olhar profundo e multifacetado sobre aquilo que nos acompanha desde sempre — e que, ironicamente, nos obriga a valorizar o agora.
Este enredo nasce da vontade de cantar o que é calado. De desfilar o que é evitado. De dar cor, forma e ritmo àquilo que muitas vezes é visto apenas como fim. Nosso cortejo percorre o medo, a filosofia, a cultura, a crítica, o luto e, por fim, o renascimento. Cada setor foi cuidadosamente pensado para costurar diferentes camadas desse grande mistério universal — com beleza, com verdade e com emoção.
A morte, aqui, não é só ausência. É pergunta, memória, resistência, ideia. É denúncia quando é desigual, é afeto quando é saudade, é celebração quando vira dança, tambor e ancestralidade.
Fazemos da morte um enredo, sim. Mas, acima de tudo, fazemos dela um espelho que nos ensina a viver melhor. Um canto para o que parte. Um grito pelo que fica. E um samba que insiste em renascer.
No nosso primeiro passo no Grupo Especial, entregamos um enredo que é inteiro: forte, lírico, crítico e profundo. Um desfile que é, ao mesmo tempo, despedida e acolhimento. Porque se a vida é o amor da nossa existência, que a morte também possa ser entendida — e, quem sabe, até sambada.